Água foi o tema do Mercado Medieval de Óbidos 2018. Fonte de superstição e do medo, de fertilidade e do imaginário, elemento fundamental na paisagem e bem constante em afazeres comuns, a água é uma força da natureza essencial à vida nos tempos medievos.
Recurso natural presente no quotidiano dos diferentes estratos sociais, criou hábitos e culturas e foi presença marcante no imaginário do homem medieval na música, na pintura, no teatro, na literatura, nas narrativas de histórias e estórias.
Um barco de 26 metros fundeado na Cerca do Castelo
Um barco de 26 metros de comprido por 5,6 metros de largura esteve ‘fundeado’ no Porto de Pipas, no fosso da cerca do castelo. Este elemento cenográfico era uma réplica de uma embarcação do século XII, retirada do fundo do Mar Mediterrâneo, perto de Barcelona, por uma equipa do Instituto Superior Técnico.
“Na Idade Média já existiam barcos destes a navegar, não em mar aberto mas sempre de capotagem, junto à costa”, explicou Patrícia Figueiredo, da organização do Mercado Medieval. Nos séculos XII e XIII havia uma forte ligação de Óbidos a Salir do Porto, que na altura era um porto bastante importante, onde circulavam embarcações de mercadorias como a que se encontra reproduzida no mercado. “Até há quem defenda que ali foram feitas as primeiras caravelas que depois partiram para os Descobrimentos, pois chegava facilmente a madeira vinda do pinhal de Leiria”, explicou a responsável. A ligação de Salir a Óbidos faz-se também pelo facto de ser a mesma rainha quem administrava o povoado e o porto. “Apesar do concelho não ser o mesmo, os pescadores de Salir pagavam impostos à Igreja de S. Pedro, em Óbidos”, acrescentou. Mais: no Inverno os pescadores não podiam ir ao mar e então mudavam-se para o Arelho e viviam da pesca na Lagoa.
No Mercado Medieval, este barco ficava situado no Porto de Pipas, ladeado por tavernas que também adequaram a decoração à temática da água, assim como alguma da sua ementa, para incluir mais peixe: Ameijoas, bacalhau, polvo, berbigão e enguias, jaquinzinhos fritos e a sopa de peixe. “Os estrangeiros que nos visitam procuram muito o peixe, especialmente os do norte da Europa”, explicou Patrícia Figueiredo.
Palestras sobre os tempos medievos
No âmbito do trabalho desenvolvido de aprofundamento temático para o Mercado Medieval de Óbidos, em 2018, procurou-se “aplicar” e “reforçar” o rigor científico e académico ao evento, inserindo esta iniciativa na estratégia de reforço da componente cultural e científica do evento, procurando, no mote da Óbidos Vila Literária, alargar e aprofundar os conhecimentos daqueles que nos visitam.
Para tal, foi realizado o convite à Dra. Manuela Santos Silva, uma das maiores medievalistas em Portugal, que muito tem trabalhado sobre Óbidos Medieval, sendo uma das autoras dos trabalhos científicos da Rede de Investigação, Inovação e Conhecimento de Óbidos, que nos veio falar de “Óbidos na época medieval: a água e a sua importância“; e à Dra. Isabel Freitas, da Universidade Portucalense, que trouxe o tema “Água na Idade Média, como elemento físico do homem medieval”.
Ceias Medievais esgotadas
Os serões medievais foram um sucesso. A organização mais que duplicou o número de lugares diários na edição de 2018 e aumentou o número de dias das Ceias Medievais.
O bilhete do serão medieval incluía a entrada no evento, aluguer do traje, lugar reservado no torneio e a ceia medieval, que nesse ano foi confeccionada pelos alunos dos cursos de restauração, cozinha e pastelaria da Escola Josefa d’Óbidos. Houve mais pratos em cada ceia: dois pratos de carne e dois de peixe, e houve uma apresentação mais próxima da época, com a aposta em confeções de empadas com carne de javali.
Moedas Novas
Na 16ª edição houve também lugar a nova cunhagem de moedas para circular no Mercado Medieval . O torreão, assim se chama a moeda do Mercado Medieval de Óbidos, ganhou três novos exemplares, que podiam ser adquiridos e trocados por produtos dentro do mercado. Não se tratavam de réplicas antigas, mas sim moedas feitas tendo por base três moedas importantes em Portugal: a primeira moeda cunhada em Portugal, do tempo de D. Afonso Henriques; outra baseada numa moeda de ouro de D. Sancho; e uma terceira, do tempo de D. Dinis. “O mercado medieval é um evento do século XXI, mas resultado de muita investigação e com rigor histórico” conclui Patrícia Figueiredo, dando conta que se baseiam em publicações fidedignas e trabalho das universidades portuguesas, especialmente de Lisboa e Coimbra.
Fontes
Valdivieso, Mª Isabel Del Val, El Agua En El Imaginario Medieval, Los Reinos En La Baja Edad Media, Publicacions de la Universitat D’ Alacant
Trindade, Luisa, Corpo e Água: os Banhos Públicos em Portugal na Idade Média, Centro de Estudos em Arqueologia, Arte e Ciencia do Património
Suplemento Mercado Medieval de Óbidos – Gazeta das Caldas, 20 Julho 2018